PROBLEMAS CONJUGAIS

“Lá em casa, parece que tudo é motivo para um braço-de-ferro… Às vezes, questões mínimas transformam-se em discussões épicas, que se prolongam durante imenso tempo e não levam a lado nenhum. Somos pessoas muito diferentes, mas nisto somos demasiado iguais: nenhum de nós quer ceder.”

Problemas conjugais.

A designação “problemas conjugais” é aqui utilizada para referir todos os problemas que possam ocorrer no contexto de um relacionamento amoroso – quer os parceiros se encontrem casados, quer vivam juntos sem estarem casados, quer tenham uma relação de namoro sem viverem juntos. As dificuldades de relacionamento amoroso podem ter origem em vários fatores. Podem resultar de expetativas irrealistas face à relação ou ao parceiro, de dificuldades ao nível da comunicação, ou de ambos.

Expetativas irrealistas.

A informação existente, à nossa volta, sobre o tema do “amor” é imensa. Ideias como “viver felizes para sempre”, “adivinhar e satisfazer todas as necessidades um do outro”, “ser completamente aberto e honesto com o parceiro”, “apoiar incondicionalmente o parceiro”, “se existir amor, tratar bem o parceiro não implica esforço” são-nos vendidas como ideal romântico… mas não traduzem de forma realista aquilo que os relacionamentos amorosos costumam ser na vida real. Outras expetativas potencialmente problemáticas são mais individuais, construídas durante o percurso de vida de cada um dos parceiros, na família em que cresceu e nas suas experiências anteriores, e transportadas para o relacionamento atual. Em ambos os casos, ao constatar que estas expectativas não correspondem ao que se passa no seu relacionamento, as pessoas sentem-se perturbadas com este relacionamento, e com o parceiro. Cada um exige que o outro se comporte de acordo com a sua expectativa, e fica triste ou zangado por este se comportar da forma como se comporta.

Dificuldades de Comunicação.

A ideia de que “um casal precisa de comunicar adequadamente” é um lugar-comum amplamente difundido. Mas de que falamos quando falamos de comunicação? Referimo-nos, por um lado, à comunicação verbal, ou seja, às palavras que utilizamos. A comunicação verbal pode ser distorcida de várias formas, nomeadamente:

  • A utilização de generalizações (“Tu sempre/ Tu nunca”);
  • Exagerar o negativo (“Isto significa que a relação está condenada”);
  • Desvalorizar o positivo (“Esta relação não tem nada de bom”);
  • A “leitura da mente” (“Eu sei que tu sabes que eu sei..”);
  • A arbitragem das emoções do outro (“isso não é coisa de pessoa normal!”);
  • O envio de mensagens incompletas (ou de “indiretas”). Frequentemente, o emissor da mensagem está convicto de ter sido compreendido, e o recetor, confuso, adapta o seu comportamento àquilo que compreendeu, aumentando a confusão…
Além disso, a comunicação também ocorre de forma não-verbal, ou seja, através da nossa apresentação, da forma como posicionamos o nosso corpo e como utilizamos a nossa voz. Novas dificuldades podem surgir quando o verbal e o não-verbal estão em contradição um com o outro (por exemplo, dizer “Está tudo ótimo!” de forma zangada, dizer “Vai, não te preocupes comigo…” de forma abatida, dizer “Que pena isso te ter acontecido” com um sorriso irónico, etc). Este tipo de comunicação é confuso para o recetor, que fica sem saber a qual das mensagens deve responder.

As “regras” do casal.

Até aqui temos vindo a falar separadamente do contributo de cada um dos parceiros para as dificuldades do casal – as expectativas que alimenta, e a forma como as comunica. Contudo, cada casal é mais do que a soma dos dois parceiros. Em cada casal, 1 + 1 = 3, sendo este terceiro elemento o “Nós”. E cada “Nós” tem regras que lhe são próprias. Estas regras podem ser de 3 tipos:

  • Admitidas – regras definidas explicitamente pelos elementos do casal (por exemplo, um dos parceiros cozinha, e o outro faz as limpezas);
  • Implícitas – regras que não são definidas explicitamente, mas cuja existência os elementos do casal reconheceriam se fossem questionados sobre elas (por exemplo, avisar o outro quando se vai passar a noite fora);
  • Secretas - regras que o casal ou um dos seus elementos negaria, mas que seriam constatadas por um observador atento (por exemplo, um dos parceiros sabota sistematicamente os planos do outro quando estes não o incluem).
Muitas vezes, as regras são pouco claras, ou incompatíveis entre si. Ou então, a transgressão de uma regra é punida pelo “lesado” de forma indireta e incompreensível para o “transgressor” – por exemplo, amuando. Contudo, o verdadeiro campo de batalha reside muitas vezes na formulação das regras respeitantes ao direito de estabelecer e impor regras (por exemplo, um dos elementos do casal pode aceitar a regra de que é sua a tarefa de levar o lixo, mas considerar inaceitável o facto de o outro lho lembrar). E isto transforma-se numa luta pelo poder na relação.

Quebrar ciclos viciosos na interação do casal.

Num casal, o comportamento de cada um dos parceiros determina e é determinado pelo comportamento do outro. Isto não acontece de forma linear (por exemplo, A afasta-se porque B insiste ou B insiste porque A se afasta) mas de forma circular (A afasta-se porque B insiste e B insiste porque A se afasta). Portanto, face a um problema de relacionamento amoroso, não existe geralmente um “culpado” e uma “vítima”, e tentar identificá-los será tão arbitrário como tentar determinar se uma zebra é branca com riscas pretas ou preta com riscas brancas… Ambos fazem parte do ciclo vicioso, e a intervenção incidirá sobre este ciclo. Num primeiro momento, pretende-se construir em conjunto com o casal uma explicação dos problemas que lhes dê um sentido, e que permita estabelecer um plano para a intervenção. Esta intervenção poderá passar pela desconstrução de expetativas, pela promoção de competências de comunicação ou pela reflexão conjunta sobre as regras da relação. Dito de outra forma, pretende-se abordar “as coisas de sempre” de uma forma diferente da habitual.